domingo, 26 de setembro de 2010

A estrutura das palavras

De acordo, ainda, com as lições de Câmara Jr. (1989), de quem vale lembrar a condição de pioneiro da Lingüística Moderna do Brasil e fonte permanente para os lingüistas contemporâneos, os morfemas podem ser classificados do ponto de vista do significado ou do significante; a lembrar claramente para nós a condição de signo lingüístico inerente a todos os morfemas.

Koch e Silva (2002) sintetizam essa classificação, considerando a existência de quatro tipos de morfemas gramaticais paralelamente a dos lexicais: classificatórios, flexionais, derivacionais e relacionais.
1 Morfemas Classificatórios
As vogais temáticas, cuja função é a de enquadrar os vocábulos em classes de nomes (substantivo, adjetivo) e de advérbios.
• Vogais temáticas Nominais – a, e, o

Ex: bol – a, red – e, bol – o

• Vogais temáticas verbais – a, e,
i
Ex: compr – a – r, beb – e – r, part – i –r

Obs: radical + vogal temática = tema

• Tema nominal – de baixa produtividade em Português, é produtivo e relevante em outras línguas fortemente desinências (latim, alemão...)

• Tema verbal – de alta produtividade em Português (ama + s, ama + o, ama + mos, ama + is, ama + m)

2 Morfemas Flexionais
Flexionam ou alteram os morfemas lexicais, adaptando-os à expressão das categorias gramaticais admitida pela classe daquele. Conhecidos pelo nome de desinências.
• Desinência Nominais:
Gênero: Ø / a.

Lobo / lob – a

Número: Ø / s, es3

• Nos radicais de final em /l/ há perda dessa consoante com a ditongação como conseqüência morfofonêmica.

Ex: mar / mare + s - mares

Sal / as + i + s – sais

Para outros autores, trata-se de uma variante posicional de desinência, uma alomorfia condicionada. Para outros, ainda, trata-se de uma segunda desinência, indicadora do plural, ou seja, um alomorfe.
• Desinências Verbais:
• Numero – Pessoais

P1 – Ø, * o, * i (semivocálico)
P2 – s, * Ø, *ste
P3 – Ø, * u (semivocálico)
P4 – mos
P5 – is, * stes, *des, *i (semivocálico)
P6 – m, * o (semivocálico)
*conforme Koch e Silva (2000), são alomorfes.

• Modo – Temporais

Id Pr – Ø
Id Pr1 – va, * va (CI), ia, *e (CII e CIII)
Id Pr2 – ra (depreensível apenas em P6)
Id Pr3 – ra, * re (átonos)
Id Ft1 – ra, * re (tônicos)
Id Ft2 – ria, * rie
Sb Pr – e (CI), a (CII e CIII)
Sb Pr – sse
Sb Fut – r
If1 – r
Gr – ndo
Pa – do
* - alomorfes

2.1 Tipos de Morfemas Flexionais

a) Aditivos – os mais produtivos, resultam do acréscimo de um ou mais fonemas ao morfema lexical. Muitas vezes são cumulativos (modo – temporal...)

Ex: Canta + ria + s, boa + s


b) Subtrativos – resultam da supressão de um segmento fônico do morfema lexical.

Ex: irmão – irmã


c) Alternativos – resultam da alternância ou permuta de um fonema no interior do vocábulo. São de natureza redundante na maioria dos casos.
Ex:
avô – avó /ô/ x /ó/
formoso – formosa /ô/ x /ó/ - redundante
posto – postos /ô/ x /ó/ - redundante

d) Zero – resulta da ausência de marca para expressar determinada categoria gramatical, como é o caso do singular dos nomes. Só ocorre quando há oposição, no mesmo morfema lexical, com a presença do morfema.

Ex:
loja – lojas Ø x s
fala – falava Ø x va
falas – fala s x Ø

e) Latente – também tido como alomorfe Ø, caracteriza-se por não trazer em si mesmo o contraste entre as categorias gramaticais. Latente porque o significado revela-se no contexto.

Ex:
o lápis – os lápis
o artista – a artista

3 Derivacionais

Conhecidos por afixos (prefixos e sufixos), criam novas palavras na língua a partir do morfema lexical.

De bol – a, tem-se bol – ada, bol – eiro, bol – inha...

Não obedecem, como os flexionais, a uma sistematização obrigatória.

cantar/cantarolar

falar/*falarolar

gritar/ *gritarolar

*apenas virtual.
Presença de idiossincrasias ao lado de regularidades: nem todos os verbos português apresentam nomes deles derivados e quando há derivação, os processos são variados.
consolar / consolo
julgar / julgamento
⇒ Nem todo o substantivo português tem um diminutivo correspondente e os que existem podem ser utilizados, numa determinada frase, de acordo com a vontade do falante.

O resultado da derivação é um novo vocábulo, ao contrário da flexão que gera formas de mesmo vocábulo.

4 Relacionais ou de Posição

Expressão da concatenação dos morfemas lexicais entre si. Remete à noção de ordem no enunciado, situando-se no campo da sintaxe. São também as palavras gramaticais: preposições, conjunções.

Ex:
Sujeito + verbo + objeto
Pedro ouve Paulo
Paulo ouve Pedro
A posição 1 define, na ordem direta, o sujeito e a posição 2, o objeto.

Pouco estudada, a posição expõe, entretanto, questões relevantes na língua, alem de ampliar, enriquecimento, as possibilidades da enunciação, como no exemplo de Machado de Assis, em Brás Cubas.
“[...] eu não sou propriamente um autor defunto mas um defunto autor”. (ASSIS, 1977, p. 13).

Casa de madeira.

Pobre mas feliz.

Não veio porque não quis.

Afora esses tipos dos morfemas, existe, ainda, um tipo de morfema de produtividade baixa em português, aplicável na formação de palavras, constituindo mesmo um processo de formação: o morfema reduplicativo.

Ex:

O “nhenhenhém” do presidente Fernando Henrique.

Do que se viu, podemos expor, agora, o padrão geral da estrutura mórfica dos nomes e verbos em português.

Nomes:
• Base

• Base + Afixo.

• Base + Base.

• Base, tradicionalmente chamada de radical, ao qual se agrega ou não uma vogal temática (tema ou palavra atemática).

Obs: palavra atemática, constituída apenas pelo radical. Em Português, as palavras terminadas em consoante e vogais tônicas.

Ex: mar, café...
Verbo:

• Radical + Vogal Temática + Desinência Modo Temporal + Desinência Número – Pessoal
R + VT + DMT +

3.3 ANÁLISE MÓRFICA
A análise mórfica consiste na descrição da estrutura do vocábulo mórfico, depreendendo suas formas mínimas ou morfemas, de acordo com uma significação e uma função elementares que lhes são atribuídas dentro da significação e da função do vocábulo’. (KOCH; SILVA, 2002, p. 20).

3.3.1Depreensão dos elementos mórficos
a) Principio Básico: Comutação – operação contrastiva por meio de permuta de elementos para a qual são necessárias:

• segmentação de vocábulo em subconjuntos;

• pertinência paradigmática entre os subconjuntos que vão ser permutados.

Princípios Auxiliares:
•Alomorfia
- livre, não condicionada fonologicamente;

- fonologicamente condicionada (mudança morfofonêmica).


b) Mudança Morfofonêmica: aglutinação de fonemas, nas partes finais e iniciais de constituintes em seqüências, acarretando mudanças fonéticas.

Como altera o plano mórfico, a mudança é morfofonêmica.

[in + grato] = ingrato

[in + moral] = imoral

[feliz + idade] = felicidade

c) Neutralização: “[...] perda da oposição entre unidades significativas diferentes”.

1ºpessoa (cantava) x 3º pessoa (cantava)

2º conjugação (e) x 3ª conjugação (i)

vendes, vende; partes, parte